Pular para o conteúdo principal

Criatividade ao jeito Toscani de ser...


Tenho uma frase, todinha minha, que escrevi por conta própria sem ajuda de ninguém ("the perks of writing", rs), colada em diversos cadernos; notebooks e sketchbooks, que diz: "TALENTO ESCAPA PELAS FRESTAS".

A ideia dela é que o seu talento - ou talvez sua vocação fosse melhor - não fica submerso e impossível de notar. Ele sempre escapa pelas frestas... É a pessoa que não trabalha com culinária mas que é a "mão boa da família", mesmo que seja contadora no dia a dia; é a pessoa que sempre "bate as fotos", mesmo não sendo fotógrafa etc... Em alguns casos, o profissional que se diverte com sua profissão nas horas vagas. A questão mesmo é: se você ama algo, você não consegue fugir disso... Seja o que for, vai sempre escapar pelas frestas!

Aí recentemente chegou aos meus ouvidos a história de uma equipe - vamos dizer, imaginária no momento - que reclama que não tem liberdade de criar, sempre fazendo a mesma coisa... Escutar essas coisas pela rádio peão (nesse caso, "rádio manada" seria mais apropriado) me dá um tédio triste, apesar de servir para confirmar a minha teoria.

Em primeiro lugar, porque "liberdade criativa" é um dos mitos perpetrados por gente sem imaginação e criatividade. Criatividade é por definição uma ação de rebeldia contra o status quo (seja em arte, seja na criatividade de adotar um novo procedimento). Esperar por "permissão para se rebelar" é tão contraditório e sem sentido, que eu não vejo nem motivo para comentar. Alguns diriam que oferecer "liberdade criativa" nesse caso é na verdade oferecer um ambiente acolhedor ao erro, a aprendizagem e as tentativas mas... Desculpe! Nem todos os negócios são centros de fisioterapia, por exemplo. Neles eu entendo o ambiente de apoio ao erro e as tentativas. Fico imaginando um Buffet de casamento: os noivos escolheram um bolo mármore de três andares, e você chega lá com algo completamente diferente e diz: "Não foi o que você pediu mas, minha equipe usou toda a sua criatividade...".

Em segundo, e mais difícil de explicar nessa geração de "millenniuns", está algo que ninguém costuma dizer para eles: criatividade está ligada a responsabilidade. Se uma boa pizza é feita colocando a massa, depois o recheio, depois assando - eu, como pizzaiola, não preciso te oferecer a oportunidade de testar por conta própria a forma de fazer a pizza ao contrário para que você perceba "nossa, realmente esse é o melhor jeito". Se você tem um jeito melhor, e eventualmente todo mundo tem, faz parte dessa misteriosa "definição de criatividade" arranjar uma forma de mostrar que você está certo. Cada um deve assumir responsabilidade pelas suas ideias - não existe na vida uma caixa de sugestão 24 horas com os dizeres "sempre abertos a sugestões" e, mesmo que houvesse, acho que ela receberia muito lixo: boas ideias também devem sofrer o efeito da seleção natural.

Quando eu trabalhava em uma empresa de engenharia, eu desenhava blocos (desenhos padrão que se repetem em uma planta) por conta própria para facilitar meu trabalho nas próximas execuções - ninguém me pedia para eu fazer isso, e eu não pedi permissão nenhuma para fazer isso. Tudo o que eles sabiam, e era o que realmente importava para eles, é que cada vez eu terminava uma planta de maneira mais rápida e com menos erros. Quando eu trabalhava no BB, eu refiz no editor de texto do meu computadorzinho meia boca uma série de formulários para atividades padrão que existiam nas normas do banco, mas que depois de tanto entra e sei na agência, ninguém mais tinha memória. Mais uma vez, ninguém pediu isso para mim, e eu não pedi a permissão de ninguém para fazer essas coisas. Tudo que eu sei, é que quando sai dalí (depois de estar de saco cheio definitivamente de atender gente) eu sai como gerente - não como atendente, como a maioria dos meus colegas ainda estão hoje, 10 anos depois.

Toda essa "egotrip" não foi para falar "uau, como eu sou demais". Muito pelo contrário... Se eu chegar a conclusão que essas foram as coisas mais "brilhantes" que eu fiz até hoje, vou alí no canto como Kiko dar uma choradinha... Achei apenas relevante porque: foram coisas feitas nos meus dois primeiros empregos, e antes dos 22 anos. Foram coisas pequenas, mas dentro de uma zona cinzenta do que eram minhas responsabilidades. Alguém pode dizer "mas você estava em um ambiente que acolheu suas tentativas" e eu vou lhe dizer: se você realmente acha que qualquer escritório de engenharia ou banco comercial brasileiro é um ambiente acolhedor ao erro, você que precisa rever seus conceitos.

Na verdade, a questão-chave aqui é: "liberdade criativa" será dada quando isso impactar direta e positivamente os resultados que você deveria alcançar. Eu só não tomei um tacape na cabeça nesses dois casos, porque essas pequenas transgressões me renderam um trabalho mais rápido e eficiente. Se eu tivesse perdido tempo para algo que não tivesse dado em nada - ou acarretado mais trabalho ou retrabalho para mim e para outros, a minha chamada "liberdade criativa" teria sido cortada rapidinho. Faz parte disso também saber dentro da sua "caixa" quais as paredes são mais flexíveis e quais são as estruturais que você não pode mover.

Resumindo, pessoas que esperam permissão me cansam! Pela vontade fraca, pela falta de fogo interior, e porque nada está realmente escapando pelas frestas além de um nhénhénhé sobre como o mundo é injusto e elas não tem uma chance. Acho que essas pessoas escutam a expressão "escola da vida" e estão sempre esperando o mesmo tratamento dos ambientes escolares - não é bem assim queridos. Não é bem assim mesmo!

Comentários

Postagens mais visitadas deste blog

Livros que Indicam Livros: 1001 Livros para Ler Antes de Morrer - BEDA #11

Publicado 1 minuto antes da badalada final mas... Está valendo. Com essa história de ter uma meta ambiciosa em relação aos livros -- apesar da execução não estar acompanhando -- eu fico procurando lugares que podem me dar ideias interessantes de leitura... Embora que quem consegue fazer uma lista de 100 livros para ler com livros que tem em casa não precisa muito de inspiração -- precisa mais de bunda na cadeira, sofá ou cama e algumas horas diárias de leitura ininterrupta... Mas isso já é outra história. Acabei lembrando desse meu livro "esquecidinho" na estante, o "1001 Livros para Ler Antes de Morrer". Esse pequeno "catatau" de 960 páginas (estou denunciando a idade com esse termo? Provavelmente sim) contém uma pequena resenha dos sugeridos 1001 Livros, com um pouco de história e importância da obra. Também é um livro interessante de folhear porque você encontra pinturas e fotografias relacionadas as épocas das obras. Ele está dividido em 04 grand...

"Minha alma, sabe que viver é se entregar..."

Coruja mesmo! Mas quem mandou ter o bebê mais lindo do mundo!? Hoje Lívia fez dois meses de vida. E eu estou meio que apaixonada por essa música, " Meu Sol " do Vanguart... Talvez porque "Além do Horizonte" chame atenção especial dessa linda bebê (vá entender, a cadeirinha dela ao lado do computador fica de costas para a TV -- e a menina não quer saber de mais nada, além de Além do Horizonte... Fica virando a cabeça para ver o que está passando... Coisas da Lili daqui); e talvez também porque seja uma "música de ninar" bem gostosa de cantar. Ou simplesmente, porque esse verso inicial é "mother fucker beautiful" ( mães ainda podem usar uma expressão dessa? ). Não há o que eu pudesse ter feito na vida para ter me preparado para os últimos 02 meses... Ainda escrevo o FAQ da mãe de primeira viagem... Cuja maior descoberta é a mais inútil... Muito antes de engravidar eu queria saber se existe algo em especial ao virar mãe, que faz você come...

Atrás de toda acumulação só há duas coisas: medo e escassez.

Photo by Savs on Unsplash Passei boa parte da terça-feira de carnaval arrumando uma prateleira ao lado do meu cantinho de trabalho. Era a última prateleira que faltava dar uma geral (dessa estante, tem mais duas na fila). A arrumação era fundamental: cada vez que procurava alguma coisa por ali — ou simplesmente olhava em sua direção — algo sempre caia na minha cabeça… Ou no computador… Ou mais temível e provocador de palavrões, no pé. Mais de uma vez eu tive que segurar uma reação em cadeia de livros, cadernos e grampeadores despencando. Era como trabalhar ao lado de uma área com potencial risco de avalanche. Rearrumar áreas entulhadas que você não visita há tempos sempre nos traz doces recordações. Reencontrei cadernos antigos que ainda esperavam atribuição de funções e uso. Reencontrei livros que eu estava tão animada pra ler… Anos atrás, mas ainda assim interessantes. E é claro, encontrei livros que só alguns momentos fora de si explicam (como um “ Contabilidade ao alcance...